segunda-feira, julho 31, 2006

Dr Feelgood - Milk & Alcohol

Para quem esteve e não esteve no sábado á noite em Gaia num festival

sexta-feira, julho 28, 2006

"Cultura" privada.

Regresso depois de um período completamente entregue “às questões da cultura”. Entretanto, fazem-se rebentar bombas e o mais é do mesmo! O mesmo neste momento, aqui junto das nossas portas, pretende agora privatizar aquele que será o teatro municipal do Porto que mais deu à cidade nos últimos anos, sobretudo até 2001/2002, nos foros da cultura.

Encontramos hoje um domínio absoluto da “cultura de massas”. A oportunidade gerada pelo galopante desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação, dotou o capital privado de ferramentas extremamente poderosas na difusão de “produtos culturais” facilmente descodificáveis, com a vantagem de que actualmente serão acessíveis a todos. Com base em interesses privados, os investidores/empresários/produtores nos domínios da cultura, porque objectivando por vias do lucro, o retorno dos montantes aplicados, jamais centrarão as suas aplicações em bens culturais pouco ou nada rentáveis e que só despertam interesse numa minoria social. A quem compete então, trazer à sociedade as “culturas” nas as quais estes empresários estão pouco motivados em apostar?

A resposta parece-me tão evidente como encontrar os “maus” na questão Israel vs. Líbano. Obviamente que é ao Estado, e ao poder local em sua representação, que compete o investimento em bens culturais não lucrativos. Não acredito que os privados alguma vez se sintam determinados ao ponto de investir em artistas que não enchem uma sala. O que fazer com aqueles que lotariam as restantes cadeiras vazias? O que fazer com os artistas que as levaram a comprar bilhete?... Eliminá-los? Transformar a sociedade numa amálgama de Britney’s, JLO’s, Floribelas e Shakiras? Assim aos magotes e em catadupa? Neste caminho seria estarmos inevitavelmente, cada vez mais entregues ao entretenimento e menos à cultura, negligenciando que para muitos cultura é entretenimento.

O Rivoli tem protagonizado um trajecto progressivamente decadente. Nos últimos 3/4 anos temos assistido a uma rendição daquele equipamento cultural ao interesse privado. O volume de programação que a “Culturporto”, empresa municipal que gere o teatro, tem efectuado para aquele espaço é cada vez menor, ao passo que as produções privadas, aquelas que poderemos encontrar em toda a parte, se não no Rivoli, no Sá da Bandeira, no Coliseu do Porto, entre outros, conheceram um aumento que me parece evidente. Ao privatizar o Rivoli, o poder municipal demite-se de programar a cultura da cidade. De trazer ao Porto alguns dos artistas que de outro modo não nos visitarão, pelas razões apresentadas.

Os primeiros danos não tardaram em aparecer: no “Fantasporto”, no “FITEI”, e quem sabe até no projecto “SEM REDE – Rede Nacional de Programação de Novo Circo”, do qual o Rivoli faz parte, apresentando-se como uma forma de cooperação entre equipamentos culturais quase única em Portugal e que poderá não visitar a cidade ou pelo menos um Rivoli privado; entre muitos outros projectos, nomeadamente afectos a companhias de teatro da cidade. Ao que parece, a realidade descrita no post “Portugal Cultural: ditadura de maioria”, de 31 de Março último, ganha contornos cada vez mais demarcados na cidade do Porto. Naquele texto alguém comentava que “Para o cacique, nada melhor que a homogeneização. Se esta for num contexto de ignorância, melhor ainda...”. Se o Rivoli cair nas mãos pelas quais julgámos que todo este joguete está a ser criado, a cidade do Porto ficará incomparavelmente mais pobre. Aguardemos que a seguir-se a privatização, pessoas de bem, algumas delas pertencentes a projectos até agora concretizados no Rivoli, possam “vencer” o duelo. A questão será, por quanto tempo se manterão em pé administrando um equipamento como o Rivoli, com programação cultural sem alvejar as “massas”, tendo de sustentar-se?

A cultura, num estado democrático, não pode ser contemplada como o pote do qual tirámos o ouro nosso de cada dia. Mesmo equacionando medidas para a maior capacidade das cidades formarem público para a cultura, o objectivo primeiro terá de ser sempre numa perspectiva em que, mais público para a cultura é sinónimo de uma sociedade mais rica em conhecimento. Depois, o facto de haver uma quantidade superior de indivíduos a “patrocinar” o sector, tornando auto-sustentável, será a cereja em cima do bolo. Por agora, nem bolo existe. Existe queques, muffins, whatever…

Bradando aos céus,
Babince

quarta-feira, julho 26, 2006

Odeio-vos, Povo da Besta e da Cruz de David


Mais depressa se quebram as máquinas e o dinheiro do que a vontade dos de bom coração!
Lutem com toda a causa e direito!
Resistam!

Líbano



O pior cego é aquele que não quer ver...

segunda-feira, julho 24, 2006

Give them guns and feed them meat








quinta-feira, julho 20, 2006

Espectros de Mim

Noite escura...
Completa e envolvente!
Pode ser que um dia voltes para me ver, apesar de não acreditar.
A tua memória enche de força, os batimentos o meu motor de sangue,
que talvez só se mantém vivo à custa dessa energia.
Espero que esteja tudo bem contigo!
Sem mim por perto, deve estar... Que tens feito?
Por onde andaste? Que viste e viveste? Tanta coisa que te quero perguntar e já não tenho como...
Tu já nem lhe encontras o porquê. Compreendo. Aceito.
Mas tenta só... só ouvir-me! Não te vou mentir.
Dada a gravidade de tudo, bem preferia estar a mentir!
Há quem diga que são os azares da vida. Não há dia que passe e não me lembre, não há noite que passe sem recordar, a tua tensão ao meu chegar. Tudo ficou bem com aquele beijo...
Lembras-te? Se calhar fiz a maior asneira da minha vida... ao deixar-te... mas tinha de ser. Desculpa!
Porque hoje apenas vivo dentro de ti. Este não sou eu. Nunca fui. Não quero ser e a ele estou amarrado.
Vê...
Escuta...
Apercebe-te do pulsar da vida. Se o tentares perceber, muito tempo precioso desperdiçarás e não sobrará muito para o resto. Se o ignorares é a ilusão. Limita-te a seguir o teu ritmo, como um escravo ao ritmo do tambor...
Podes marcar o ritmo do teu corpo mas nunca o das remadas! Não te cabe a ti decidir quando, quanto e como remar, só o porquê.
Mas porquê?

quarta-feira, julho 19, 2006

passagem

"Agora penso afinal que o mundo é um enigma benigno, que a nossa loucura torna terrível porque pretende interpretá-lo de acordo com a nossa própria verdade."

O Pêndulo de Foucault
Umberto Eco

O espelho não devolve a minha face. Bebia ao balcão como um adulto: fazia o pedido com uma voz cerrada e adulta, olhos no infinito por detrás de quem atende os pedidos. Saía e vinha passear a cerveja - noites agradáveis e quentes e sem vento ou como ontem em tempestades de Verão. A rua plena de pessoas e vozes que incomodam vizinhos, alegria... ou um qualquer antídoto para o habitual cansaço.

Ahmed sai detrás do balcão e dirige-se até à porta para repousar e saborear o ar deste deserto. Oferece um cigarro a quem quer que esteja cá fora; fuma, conversa... entram mais pessoas: Assalamu rraleikumu. Rraleikumu ssalam. - Bem vindos!

Volto ao balcão e peço outra cerveja sem ver a minha face devolvida. A rua chama-me e eu volto para o passeio e sento-me nele... esperando. Hoje não aparecerá muita gente, mas serão importantes.

Bebo e penso a passagem dos anos. Tráz toda a sabedoria relativa: acomodamo-nos ao mundo quando o deviamos compreender. As coisas existem fora de nós, longe de qualquer absoluta integração nos processos cerebrais que acabam por nos caracterizar enquanto indivíduos. Sempre assim foi... Crescer é cair na falácia da compreensão - ou pensar que os mecanismos que esculpimos para o compreender o exterior são os mais perfeitos. - "practice makes perfect"!

Ahmed, em muitas conversas tidas em raros momentos de pausa, diz que o Curdistão morreu... que a Turquia não existe. Quando lhe perguntei se a língua curda mantém uma componente escrita ele respondeu-me que o alfabeto é o europeu... mas que até 2000 não se podia escrever ( e que quem fosse apanhado era morto.) Ahmed diz que já passou pela Holanda. Itália, Alemanha... sempre a trabalhar ou a procurar um país.

"Robot! Ahmed robot! Não precisa de dormir! Gosta de discoteca!"

Enquanto sorri e bebe o seu chá trabalha das 8 da manhã às 2, 3, 4 da manhã - não expulsa quem está em sua "casa" a beber ou a rir. Se lá chegarmos às 8 da manhã para tomar o café que inaugura o dia ele está lá a fazer o pão e a massa para as pizzas desse dia... a cortar os vegetais que se vão usar nos pratos que lá tem para todos comerem. As mãos que fazem o pão, as mãos que fazem a massa, as mãos que cortam os vegetais.

Soul food! - entrar de alma a arder, a morrer de fome e ser alimentado até ao âmago. O picante desperta as papilas para o milagre do sabor e todo o mundo parece acordar. Quase sempre se recusa a deixar pagar o café no final das refeições... uma oferta...

Ahmed diz-se verdadeiramente democrático: nas paredes tem um santo antónio e uma tela que diz que quem é pobre não precisa de ir a Meca. Portanto há espaço para todos aqui... Cruzam-se pessoas e falam respeitosamente, aprendem devagar a existir...

A "vida económica" corre-lhe bem enquanto se mata a trabalhar dizendo que não precisa de dormir e nós nos enchemos de cerveja e dos seus cozinhados.

Alimentados até à alma podemos continuar a despi-la... imensas conversas em que se faz ver que tudo é multiplice, tudo é diferente, tudo é uno debaixo das estrelas.

Têm sido dias bons: aproveitar o sol e a praia; a companhia de quem me faz sentir humano e parte de todo este microcosmos que reconhecemos como sociedade; a companhia de amigos que infelizmente se vêem menos vezes.

Ontem, graças à bondade de Ahmed, para saciar a fome e a sede numa das paragens da chuva em cima de um banco havia: uvas, whisky, vodka, champagne... deu-me uma prenda.... um licor que não tenho coragem de abrir.

Matando as últimas luzes com um sorriso cansado nos lábios - amanhã há trabalho para fazer.

Chev baz Ahmed! Amanhã voltamos para comer algo e nos rirmos um pouco... eu trago o champagne.

josé de arimateia, um ano mais velho

terça-feira, julho 18, 2006

O Capitão Psicadélico e a sua Banda mágica ao vivo!




Estranho

"To every place of entertainment we go with expectation and desire of being pleased; we meet others who are brought by the same motives; no one will be the first to own the disappointment; one face reflects the smile of another, untill each believes the rest delighted, and endeavours to catch and transmit the circulating rapture. In time, all are deceived by the cheat to which all contribute. The fiction of happiness is propagated by every tongue, and confirmed by every look, untill at last all profess the joy wich they do not feel, consent to yield to the general delusion, and, when the voluntary dream is at an end, lament that bliss is off with a so short duration."

" The man who makes an animal of himself takes away the pain of being a man. "
Dr. Samuel Johnson

Por vezes sinto-me uma besta pedrada envolto em nevoeiro.

Saudações e Abraço!

Xiquinho

domingo, julho 16, 2006

Quando ao cozinheiro dá lugar o engenheiro alimentar!

Composição para aqueles que comem "fórmulas"!

Vasculhando o lixo,
Babince

quinta-feira, julho 13, 2006

Return To Wild






Obrigado Ian, Billy....

Não houveram palavras para descrever o que se passou ontem no Coliseu do Porto!

12 de Julho de 2006 - O começo do mundo...

Lover, you should've come over


Looking out the door I see the rain fall upon the funeral mourners
Parading in a wake of sad relations as their shoes fill up with water
And maybe i'm too young to keep good love from going wrong
But tonight you're on my mind so you never know

When i'm broken down and hungry for your love with no way to feed it
Where are you tonight, child you know how much I need it
Too young to hold on and too old to just break free and run

Sometimes a man gets carried away, when he feels like he should be having his fun
And much too blind to see the damage he's done
Sometimes a man must awake to find that really, he has no-one

So I'll wait for you... and I'll burn
Will I ever see your sweet return
Oh will I ever learn

Oh lover, you should've come over
'Cause it's not too late

Lonely is the room, the bed is made, the open window lets the rain in
Burning in the corner is the only one who dreams he had you with him
My body turns and yearns for a sleep that will never come

It's never over, my kingdom for a kiss upon her shoulder
It's never over, all my riches for her smiles when I slept so soft against her
It's never over, all my blood for the sweetness of her laughter
It's never over, she's the tear that hangs inside my soul forever

Well maybe I'm just too young
To keep good love from going wrong

Oh... lover, you should've come over
'Cause it's not too late

Well I feel too young to hold on
And I'm much too old to break free and run
Too deaf, dumb, and blind to see the damage I've done
Sweet lover, you should've come over
Oh, love well I'm waiting for you

Lover, you should've come over
'Cause it's not too late

Jeff Buckley, Grace

josé de arimateia, just waiting by the elevator's closed door

quarta-feira, julho 12, 2006

[ fase de retiro ]

O jardim esteve encerrado por questões que só à autarquia dizem respeito. Agradecemos a todos quantos tentaram, em vão, avançar as eventuais cercas que este jardim possa ter. De qualquer modo, ainda há muito lixo por apanhar!

Reportando,
Babince

sábado, julho 08, 2006

Um pequeno tributo a Grandes guitarristas de Blues

Stevie Ray Vaughan
Jimmy Page

Rory Gallagher

terça-feira, julho 04, 2006

A vida é um dicionário de símbolos

“O Feldwebel Daussig está estendido ao longo de uma parede e observa atentamente a rua por uma vigia aberta entre os tijolos. De vez em quando relaxa a cabeça e fecha ligeiramente os olhos cansados. Mas volta imediatamente a fixar-se no ponto de mira. A cerca de quatrocentos metros vê um soldado russo que leva um balde na mão e atravessa a rua a correr. Daussig aperta o gatilho. O russo caiu. Vinte minutos depois, um oficial atravessa também, ainda mais depressa, parece duvidar, vira a cabeça na direcção da casa onde está emboscado o Feldwebel. Um disparo. O oficial roda sobre si mesmo e cai. Dois soldados rastejam até ao pé dele tentando recolher o seu corpo, enquanto uma metralhadora abre fogo contra a parede de tijolo que protege Daussig. Os tijolos saltam em migalhas, mas já Daussig tinha recuado para outra posição de tiro, a uma centena de metros da anterior.
Nos intervalos das ofensivas, a luta contra os snipers mantém ocupadas as melhores espingardas de um e outro lado. Um homem com boa localização pode, sozinho, infligir baixas elevadas ao inimigo. Com frequência é necessário montar uma verdadeira operação para desalojar estes atiradores isolados. Os russos decidiram desembaraçar-se de um deles, que mantém debaixo de fogo da sua arma o acesso a uma cave onde se instalou um posto de comando. O sargento Zaitsev, atirador escolhido, recém-chegado a Estalinegrado, é encarregado do ataque. Transportando a sua espingarda-metralhadora preparada, chega à entrada da cave com o Capitão Rodin:
- Felizmente – diz o capitão – não pode apontar para a entrada da cave, pois se assim fosse, ninguém podia entrar nem sair. Está instalado no 4º andar de uma casa, a uns trinta metros daqui, para a direita, do outro lado da rua. Se te inclinares um pouco para este lado, o camarada consegue ver a casa.
O capitão põe-se de cócoras no portal e o sargento imita-o. Por cima da beira da trincheira escavada diante da porta, pode ver-se o esqueleto de uma casa sem tectos, que deixa ver a luz do dia através das suas janelas vazias.
- É a última janela, no 4º andar – diz o capitão.
- Terei de dar a volta ao edifício, camarada capitão. – Responde Zaitsev – Está demasiado bem protegido para poder abatê-lo de frente. Podíamos estar aqui a disparar sobre ele durante duas horas sem o menor resultado.
- Não podemos dar-nos a esse luxo. As munições e os víveres são escassos. Cada granada, cada bala, deve ser aproveitada. Não se trata de fazer troca de fogo-de-artifício. O camarada tem de abatê-lo à primeira ou segunda bala.
- Bem, então como hei-de fazer para dar a volta ao edifício?
- Não sei.
- Então vou sozinho.
- Não. Eu acompanho-o. Gostaria de poder dizer que conheço a disposição dos campos de minas que possam existir entre a posição que ocupamos agora e o outro lado da casa. Contudo, quando se tem várias semanas de experiência desta guerra de rua, adquire-se uma espécie de 6º sentido: “Ouvem-se” as minas. Só tem de me seguir. Ponha os seus pés nas minhas pegadas e faça exactamente o mesmo que eu.
Avançam pela trincheira, a uns passos de distância um do outro. Vinte metros à frente, o capitão pára e ergue lentamente a cabeça, para olhar por cima da beira da passagem.
- Podemos continuar pela trincheira até à esquina, estaremos sempre fora de mira do atirador, mas teremos de percorrer o dobro da distância por terreno desconhecido e provavelmente semeado de minas. Se sair agora, podemos tropeçar nalguma bala, mas teremos de percorrer menos caminho e, portanto, menos riscos de minas.
Zaitsev reflecte uns segundos e depois responde:
- Vamos pelo caminho mais curto.
- Essa é a resposta adequada, sargento, sobretudo em Estalinegrado. O sargento aprende depressa. Siga-me três metros atrás. Vê aquela coronha de metralhadora velha naquele monte de escombros? À direita, há uma cratera. Deve ser bastante profunda, pois foi produzida por um obus de 105.
- Como é que sabe?
- Muito simples: a borda não está demolida. Portanto, só há um impacto de obus nesse ponto. Os obuses de 105 fazem buracos desse diâmetro, mais ou menos, e geralmente bastante profundos. Está preparado?
Zaitsev faz um sinal afirmativo. O capitão sobe pela borda da trincheira e começa a rastejar pelo solo esburacado e coberto de escombros. O olhar de Zaitsev segue-o com uma atenção fascinada. Se o capitão não saltar e Zaitsev seguir, exactamente as suas pegadas, estará a salvo... Sai da trincheira e começa a infiltrar-se, com o ventre colado à terra. Num instante, compreende porque é que, em Estalinegrado, todos os uniformes são cor de terra e porque é que, nos momentos de descanso todos os homens manejam agulha e linha.
Teria avançado cinco metros quando, subitamente lhe pareceu que todas as espingardas, todas as metralhadoras, todos os canhões de Estalinegrado estavam a disparar sobre ele. O estrondo era aterrorizador. Zaitsev, com a cabeça enterrada no pó, espera sentir, a qualquer momento, uma dor fulminante a atravessar-lhe o corpo. Espera que o capitão o chame.
Levantando cuidadosamente a cabeça, vê que Rodin está refugiado dentro da cratera. Constata, com grande surpresa, que nenhum obus nem nenhuma bala caíram perto dele. Avança de rastos até à beira da cratera e desliza para dentro dela.
- Lançaram um ataque na outra ponta da rua. Que grande pandemónio.
- A princípio, julguei que estávamos a ser atacados.
- Parece que estão sempre perto, muito perto. Mas se o camarada estivesse no meio do ponto atacado, ouviria ainda melhor que aqui. Tudo se resume a um enorme ruído.
O capitão parece ignorar completamente o medo. Contudo, não se aventura a correr nenhum risco inútil. Reflecte antes de cada gesto, antes de cada passo. A batalha de Estalinegrado é uma dura escola…
- Agora vamos avançar até aquele monte acolá, à direita. Mas, desta vez, fique a menos distância.
Precisaram, de uma hora de avanço penoso, metro a metro, até chegar às traseiras da casa, a um ponto em que se consegue avistar a janela que o sniper utiliza como ponto de tiro. Mas não conseguem ver o atirador, que está protegido por um bocado de parede. Mas ele continua lá, de vez em quando, ouve-se disparar.
- É preciso fazê-lo sair da toca. – diz Zaitsev - Se fica protegido pela parede, nunca o apanho vamos esconder-nos nessa cratera.
Zaitsev monta a espingarda-metralhadora, coloca-a na beira do buraco, empurra uma cinta de cartuchos para o interior, aponta e dispara uma rajada. Fixando o olhar na parede meio destruída atrás do qual se instalou o atirador alemão, vê a beira de um capacete a aparecer lentamente acima da linha quebrada dos tijolos. Dispara novamente e o capacete desaparece.
- Precipitou-se a disparar. – diz-lhe o capitão.
- Não. Fi-lo de propósito. Na próxima vez, só o farei quando conseguir ver metade do capacete.
O capacete só reapareceu vários minutos mais tarde, muito mais a abaixo e, desta vez, antes do capacete assomou o cano de uma espingarda.
- Já sabe onde estamos. – murmura Zaitsev.
Fique escondido até eu acabar com ele.
- Não lhe dê tempo para fazer pontaria, dispare sargento – grita o capitão.
Zaitsev não responde. Não é a 1ª vez que desempenha uma missão deste género e tem a sua própria táctica. Da parede de tijolos parte novo disparo e, por sua vez, o sargento dispara imediatamente. Sabe que os snipers são escolhidos entre os melhores atiradores e que um atirador de elite não consegue resistir ao desejo de saber se atingiu ou não o alvo. Durante 1 ou 2 segundos, observará pela sua mira e se for suficientemente rápido, este segundo será suficiente para o abater. Zaitsev já usou este ardil muitas vezes com êxito, e, desta vez, também deu resultado. Não conseguiu ver se o Alemão ficou morto, mas ficou certamente ferido, porque a sua espingarda deslizou sobre a parede, deu umas voltas no ar e caiu sobre um monte de escombros.
- Atingi-o de certeza. – diz Zaitsev - Mas também é possível que só o tenha assustado e tenha deixado cair a arma por nervosismo. Nesse caso, o mais certo é que volte a disparar dentro de alguns minutos, pois deve ter consigo uma segunda espingarda. Portanto, deixe-se ficar escondido, capitão.
O capitão não responde e Zaitsev espera, sem pronunciar uma palavra, com o olhar fixo no bocado de parede. Ao fundo da rua, a batalha parou. Já só se ouvem rajadas esporádicas. Mas os canhões de artilharia pesada ecoam ao longe; ao fim de um quarto de hora, Zaitsev vira-se e diz.
- Devo tê-lo morto ou ferido. Em todo o caso, já não dispara.
O capitão não responde. Está caído a todo o comprimento, no fundo da cratera, com o rosto colado ao solo. Zaitsev ajoelha-se junto dele e levanta-lhe a cabeça. O olho não passa de um buraco encarnado. O capitão está morto. A primeira reacção de Zaitsev foi de uma grande admiração: a essa distância, com uma única bala, é de uma habilidade incrível. O atirador devia ter uma mira telescópica, ou … uma boa dose de sorte. Depois sentiu pena. Tinha ganho afecto por este capitão de coragem metódica. Nem sequer pode enterrá-lo. Zaitsev teve de se contentar em colocar o barrete sobre o rosto do capitão a fim de o proteger das moscas. Agora é preciso regressar ao posto de comando pelo mesmo caminho. Mas Zaitsev perdeu o seu guia. Pergunta-se se conseguirá recordar-se do caminho.
Teria percorrido aproximadamente metade do caminho quando se apercebeu de que tinha perdido o rasto. Pára, invadido por um sentimento de desespero. Mesmo levando o capitão à frente, já era um desporto capaz de abalar os nervos de qualquer um. Mas sozinho por terreno desconhecido, Zaitsev sente uma tensão tão forte que os maxilares apertados lhe doem. Antes, já tinha combatido na Polónia, em Orel, em Moscovo. Os alemães estavam sempre à sua frente. Aqui estão a toda a volta e há minas russas e alemãs por todo o lado. Sente a tentação de se atirar para a frente para a cratera mais próxima, para que tudo acabe quanto antes; com a morte ou com a salvação; pouco importa, tem é de ser rapidamente. Dominando o medo, Zaitsev continua a rastejar, centímetro a centímetro, para a cratera que está mais próxima, levando a espingarda-metralhadora às costas. Momentos mais tarde, continua a avançar. Descobre o montículo sobre o qual está colocada a velha coronha de metralhadora. Chega à beira da trincheira e deixa-se cair no interior da vala, a salvo. Diante da entrada da cave, Zaitsev vira-se e olha para a janela onde o atirador alemão estava emboscado. Parece deserta. Tirando o gorro do cinto, coloca-o na ponta de um bocado de madeira e levanta-o lentamente acima da beira da trincheira. Ninguém dispara…”



Esta história tem todo um sentido por detrás.
Descubram-no…

Mazi dEUS eX mACHINA