"Cultura" privada.
Regresso depois de um período completamente entregue “às questões da cultura”. Entretanto, fazem-se rebentar bombas e o mais é do mesmo! O mesmo neste momento, aqui junto das nossas portas, pretende agora privatizar aquele que será o teatro municipal do Porto que mais deu à cidade nos últimos anos, sobretudo até 2001/2002, nos foros da cultura.
Encontramos hoje um domínio absoluto da “cultura de massas”. A oportunidade gerada pelo galopante desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação, dotou o capital privado de ferramentas extremamente poderosas na difusão de “produtos culturais” facilmente descodificáveis, com a vantagem de que actualmente serão acessíveis a todos. Com base em interesses privados, os investidores/empresários/produtores nos domínios da cultura, porque objectivando por vias do lucro, o retorno dos montantes aplicados, jamais centrarão as suas aplicações em bens culturais pouco ou nada rentáveis e que só despertam interesse numa minoria social. A quem compete então, trazer à sociedade as “culturas” nas as quais estes empresários estão pouco motivados em apostar?
A resposta parece-me tão evidente como encontrar os “maus” na questão Israel vs. Líbano. Obviamente que é ao Estado, e ao poder local em sua representação, que compete o investimento em bens culturais não lucrativos. Não acredito que os privados alguma vez se sintam determinados ao ponto de investir em artistas que não enchem uma sala. O que fazer com aqueles que lotariam as restantes cadeiras vazias? O que fazer com os artistas que as levaram a comprar bilhete?... Eliminá-los? Transformar a sociedade numa amálgama de Britney’s, JLO’s, Floribelas e Shakiras? Assim aos magotes e em catadupa? Neste caminho seria estarmos inevitavelmente, cada vez mais entregues ao entretenimento e menos à cultura, negligenciando que para muitos cultura é entretenimento.
O Rivoli tem protagonizado um trajecto progressivamente decadente. Nos últimos 3/4 anos temos assistido a uma rendição daquele equipamento cultural ao interesse privado. O volume de programação que a “Culturporto”, empresa municipal que gere o teatro, tem efectuado para aquele espaço é cada vez menor, ao passo que as produções privadas, aquelas que poderemos encontrar em toda a parte, se não no Rivoli, no Sá da Bandeira, no Coliseu do Porto, entre outros, conheceram um aumento que me parece evidente. Ao privatizar o Rivoli, o poder municipal demite-se de programar a cultura da cidade. De trazer ao Porto alguns dos artistas que de outro modo não nos visitarão, pelas razões apresentadas.
Os primeiros danos não tardaram em aparecer: no “Fantasporto”, no “FITEI”, e quem sabe até no projecto “SEM REDE – Rede Nacional de Programação de Novo Circo”, do qual o Rivoli faz parte, apresentando-se como uma forma de cooperação entre equipamentos culturais quase única em Portugal e que poderá não visitar a cidade ou pelo menos um Rivoli privado; entre muitos outros projectos, nomeadamente afectos a companhias de teatro da cidade. Ao que parece, a realidade descrita no post “Portugal Cultural: ditadura de maioria”, de 31 de Março último, ganha contornos cada vez mais demarcados na cidade do Porto. Naquele texto alguém comentava que “Para o cacique, nada melhor que a homogeneização. Se esta for num contexto de ignorância, melhor ainda...”. Se o Rivoli cair nas mãos pelas quais julgámos que todo este joguete está a ser criado, a cidade do Porto ficará incomparavelmente mais pobre. Aguardemos que a seguir-se a privatização, pessoas de bem, algumas delas pertencentes a projectos até agora concretizados no Rivoli, possam “vencer” o duelo. A questão será, por quanto tempo se manterão em pé administrando um equipamento como o Rivoli, com programação cultural sem alvejar as “massas”, tendo de sustentar-se?
A cultura, num estado democrático, não pode ser contemplada como o pote do qual tirámos o ouro nosso de cada dia. Mesmo equacionando medidas para a maior capacidade das cidades formarem público para a cultura, o objectivo primeiro terá de ser sempre numa perspectiva em que, mais público para a cultura é sinónimo de uma sociedade mais rica em conhecimento. Depois, o facto de haver uma quantidade superior de indivíduos a “patrocinar” o sector, tornando auto-sustentável, será a cereja em cima do bolo. Por agora, nem bolo existe. Existe queques, muffins, whatever…
Bradando aos céus,
Babince
1 Comentários:
Meu caro...
Está tudo de cangalhas...
28/7/06 22:20
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