sexta-feira, março 31, 2006

Portugal Cultural: ditadura da maioria.

Portugal sofre de graves problemas relacionados com a centralização bipolar protagonizada por Porto e Lisboa, a par de enumeras assimetrias entre litoral e interior. Se estas propriedades assimétricas se reflectem no tecido socio-económico das diferentes regiões em conformidade com a respectiva condição geográfica, têm igualmente consequências ao nível cultural, na medida em que a oferta e a procura de cultura como bem de consumo é proporcional, do meu ponto de vista, à densidade populacional de uma determinada cidade. Não é então novidade afirmar que Porto e Lisboa absorvem a grande maioria das produções culturais do país, seguidos de cidades litorais como Braga ou Aveiro, considerando-se relativamente marginais as capitais de distrito interiores como Bragança ou Viseu.

Quanto ao Porto e Lisboa sabemos poder encontrar do “bom” e do “mau”. As grandes produções concentram-se neste dois centros metropolitanos, centrando-se aqui a maior fatia do orçamento disponível, que não será muito, e muito menos será para as cidades interiores. No interior, porque falta de tudo, acredito, por observação, só poder encontrar do “mau”. Nem tampouco aponto produções culturais ao nível dos grandes concertos musicais, das companhias de teatro (que no interior sobrevivem pela boa vontade de alguns), estes sabemos existir somente no litoral, pois ver um concerto “sem motivo” de festa da cidade ou semana académica em cidade do interior é episódio raro. Eu nunca vi nenhum.

Refiro-me sobretudo à actividade cultural de rotina marcada pela diversidade da oferta. Nas cidades de interior não existe ou são efectivamente invulgares aqueles locais onde podemos escutar “boa música”, que não seja propriamente de selecção M6. Ora, menos pessoas, menos procura, menos oferta: menos diversidade. Julgo ser doloroso pertencer ao grupo das dez pessoas que procurarão uma oferta de “melhor qualidade” numa cidade como Bragança. Em Porto e Lisboa serão mil essas pessoas, logo, as necessárias para rentabilizar um outro tipo de oferta não encontrada em Bragança.

Se há duas semanas falei na “alternância democrática” como sendo uma das maiores embustices da democracia portuguesa, lembro hoje que os portugueses vivem efectivamente numa “ditadura de maioria”. Aqueles que não militam com a maioria não têm expressão social e os poderes democráticos não investem para que todos tenham acesso aos bens culturais de igual modo, independentemente do factor “lucro”. Os privados promovem a iniciativa lucrativa, o estado promove a iniciativa não lucrativa mas que representa serviço público. Essa seria a democracia na qual acreditamos.

Limitem-se a pelejar para que a vossa minoria seja cada vez maior, porque as maiorias não param de crescer.

Directamente do Portugal profundo…

Babince

2 Comentários:

Blogger Unknown Disse as coisas que se seguem:

vindo do portugal profundo poderiam vir ventos de revolta... a melhor maneira de governar as pessoas sempre foi mantê-las na ignorância: sem uma diversificação da cultura que é oferecida, tendo a nossa televisão uma imensa preponderância na vida das pessoas, compreende-se porque portugal é um país tão calmo... toda a gente dorme ou está sonolenta......

abraço

2/4/06 14:32

 
Blogger Pedrão Disse as coisas que se seguem:

E prontos... O (aparente) desprezo pela cultura, seja ao nível da difusão ou da variedade de oferta, sobretudo nos meios pequenos, é o ar que alimenta pulmões da Portugalidade...

Para o caçique, nada melhor que a homogenização. Se esta for num contexto de ignorância, melhor ainda...

4/4/06 19:48

 

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